Quaresma e partilha

O terceiro dos meios tradicionais, que não somente a Igreja mas também a maioria das religiões importantes aconselham para santificar-se, especialmente durante a Quaresma, é a prática da esmola.

image008São Vicente de Paulo falava que, antes de preocupar-se em salvar as almas dos pobres, era necessário ajudá-los a perceberem que têm uma…  o que significa ajudá-los a atingir condições de vida bastante decentes a fim de que não tenham que consagrar todas as suas energias para sua sobrevivência. No entanto, além de partilhar os recursos materiais, podemos partilhar muitas outras coisas para manifestar o nosso desejo de cuidar de nosso próximo: tempo, talentos, conhecimentos, fé, …

image007Com efeito, se a miséria material deve ser primeiramente aliviada a fim de que os necessitados possam acolher outras formas de ajuda, não podemos esquecer as misérias psicológicas, moral, espiritual, ou intelectual… A partilha de seus bens, no senso mais largo, é uma contestação radical da “globalização da indiferença” que o Papa Francisco tanto denuncia. Por exemplo, consagrar um pouco de tempo ao mendigo chato ou repugnante contribui a restabelecer a sua dignidade humana. Madre Teresa de Calcutá, que sabia um pouco do assunto da miséria humana, falava que os homens necessitam muito mais de reconhecimento do que de comida bem mais amiúde. Escutar com paciência o coração que precisa abrir-se porque sofre demais ou a mente que vacila por causa da doença ou da velhice são também maneiras de partilhar com aqueles que são mais necessitados do que nós mesmos.

lampedusaEnfim, testemunhar sua fé de maneira pacífica diante do incrédulo ou do ateísta agressivo manifesta também caridade: com efeito, muitas vezes se trata sobre tudo de responder ao grito de socorro duma pessoa que busca a Verdade. Ora, em nosso mundo moderno, novas guerras de religião parecem ter começado. São alimentadas pela ignorância das convicções do outro, esta gera o desprezo e o medo. Aliás, ela é nutrida pela obstinação de alguns Estados que consideram que a laicidade deve ser a proibição de toda expressão pública das convicções religiosas, enquanto que deveria ser a organização da convivência pacífica e respeitosa delas. 

image003Santo Ivo gastava sem conta nem medida com os pobres. Não somente consagrou-lhes todo o seu supérfluo, mas também o seu sustento, sacrificando todos os seus recursos de pároco, de juiz e de advogado, dando sua própria comida e suas roupas. Vendeu até mesmo seu cavalo para ajudá-los. Pagou ele mesmo o custo das escolas para crianças necessitadas. Esgotou até suas próprias forças físicas e intelectuais no serviço aos pobres, os nutrindo, curando, defendendo e sepultando.

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Muitas vezes pensamos que somos por demais solicitados e não podemos responder a todos os pedidos de ajuda. Esquecemos que, com certeza, é muito mais difícil viver do lado daqueles que hão de pedir ajuda do que do lado daqueles que têm condições para ajudar. Ivo nos ensina que não damos nada até que não demos tudo. Madre Teresa fizera o voto ao seu Senhor de nunca recusar um pedido de ajuda; havia de escrever depois o quão isso é exigente… No entanto, essa é a exigência do Evangelho do Último Julgamento: “Quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim.” (Mt 25, 45).

avec bourseA lógica da moral cristã vai bem mais além de abster-se de fazer o mal; não é nem mesmo suficiente praticar o bem. Se trata de fazer todo o bem que podemos fazer. Os santos nos lembram constantemente esta exigência através da radicalidade do dom deles mesmos. Na primeira carta aos Coríntios, São Paulo afirma que tudo o que podemos fazer, como comer, beber ou qualquer outra coisa, deve ser feito para a glória de Deus. Tremendo pois, podemos compreender que usar os recursos naturais deste mundo é um roubo se não for com o  objetivo último de servir a Deus na pessoa do próximo. Descansar, nutrir-se, beber, estudar, cultivar-se, manter o seu corpo ou o seu espírito não pode ter outra finalidade que o serviço ao próximo.